Twittâmbulo:

Para quem já só consegue ler 140 caracteres: este artigo é sobre a importância dos próximos meses na consolidação da tecnologia nas escolas portuguesas e o papel que os diferentes modelos de software (software livre / aberto e fechado) podem ter nessa utilização.

 



 

 

Don Tapscott é alguém que reflecte sobre o mundo digital e, neste caso aqui, na sua aplicação à educação.

Em geral, concordo com o que Tapscott escreveu. Está em linha com a ideia de Geração Magalhães.

Mas existem duas fases diferentes: a fase da disseminação da tecnologia e a fase da disseminação das práticas.

A fase da disseminação da tecnologia foi ganha.

A parte crítica da disseminação das práticas ocorrerá nos próximos 12 meses. Também aí poderemos ter algo a mostrar ao presidente Obama.

Será a partir de Setembro de 2009 que o Magalhães começará, ou não, a ser realmente utilizado na sala de aula.


 

"Como será utilizado o Magalhães na sala de aula?

 

Obviamente, em rede e de forma colaborativa."

 


O enquadramento de partida

Os principais programas governamentais na área da tecnologia são o Kit Tecnológico da Educação (entre outros, 110.000 desktops nas escolas), Magalhães (400.000 Magalhães) e e-escolas (700.000 portáteis entregues). Ao criar estes programas, o governo compreendeu que concorrência leva à excelência e empenhou-se para que ambos os modelos de tecnologia estivessem presentes: o predominante - onde só dá Microsoft - e o emergente, o Linux e aplicações de Software Livre / Aberto (também conhecido por open source).

Até ao momento, e apesar das pressões e influências que sempre se movem, este equilíbrio tem sido mantido e com sucesso.

O Kit Tecnologico da Educação e o Magalhães têm dual boot (MS Windows e Linux Caixa Mágica) e o e-escolas, no operador TMN, pode ser adquirido com o Sistema Operativo à escolha.

Aqui, presidente Obama, um efeito curioso. Apesar das multinacionais americanas e japonesas não comercializarem portáteis sem sistema operativo Microsoft alegando que não existe procura, na oferta e-escolas a opção Linux tem 10% a 30% do mercado e apenas através de um operador e um único fornecedor de hardware.

Em resumo, a competição e concorrência têm feito com que ambos os modelos se esforcem para ter mais software, mais qualidade e melhor suporte. O governo, e em particular o Ministério das Obras Públicas e da Educação, têm tido um empenho genuíno e eficaz no incentivo a esta concorrência.

As diferenças

Cada modelo tem vantagens e desvantagens na área da educação para fazer vingar as suas soluções:

Modelo Open Source

Modelo Microsoft

Pros

-

modelo aberto alinhado com a lógica pedagógica de se poder ver “debaixo do capot”

- professores que compreendem a viabilidade do modelo, tornam-se evangelistas

- diversidade de aplicações vai mais de encontro ao “long tail” de utilizadores

- investimento aplicado nos fornecedores fica totalmente em Portugal e incorpora o PIB português

- bem implantado no terreno: professores e alunos no secundário conhecem-no. No 1º ciclo, não necessariamente.

- oferta por um único fornecedor das principais aplicações desde sistema operativo, suite de office a search / mail.

- máquina bem afinada de marketing e com influência política real

Contras

- filosofia release early / release often, crowd sourcing e wikinomics embate em convicções enraízadas

- qualidade das aplicações não é homogéneo

- custo de licenciamento. Numa área em que todo o investimento na formação dos professores é pouco, os 11 milhões de euros para licenciar 110.000 PCs do KTE é... __preencher de acordo com a sensibilidade__.

- a atitude “quero, posso e mando” da Microsoft gera anti-corpos a nível do middle-management da A.P.

 

Curiosamente, nem sempre a solução escolhida e imposta Top-Down é a que vinga. Um caso interessante é a instalação em 2003 de Microsoft Class Server em 1.100 salas com servidor mas que não vingou tendo sido preterido pelos professores em favor do Moodle.

A visão

 

"Dar-te a ti, dono do Magalhães, a ligação entre a ponta

dos teus dedos e a mais incrível experiência de aprendizagem.

Mesmo que essa experiencia ainda esteja por descobrir e que,

provavelmente, serás tu - e não nós - o seu descobridor."

 

 

Compreendo o que Dan Tapscott sentiu quando esteve numa sala onde os alunos têm Magalhães. A fotografia acima é de um dos pilotos que a Caixa Mágica desenvolveu em parceria com a Escola Superior de Educação. Neste caso, com o Sugar como ambiente colaborativo, cada criança com o seu Magalhães trabalhou com um colega na escrita de uma história. Sobre o mesmo documento. Se não está a perceber o que eu quero dizer com “sobre o mesmo documento” é porque, provalvelmente, não é da geração Magalhães.

A energia criativa libertada por estes 24 alunos guiados por uma professora empenhada é arrasadora. Ninguém fica indiferente.

Mas alguns problemas têm de ser vencidos na fase de disseminação das práticas.


Desafios

Existem alguns desafios por vencer:

  1. Ligação à Internet: tão depressa não teremos todas as salas de aula do 1º ciclo cobertas por Wifi e conectividade. Esse é um objectivo ambicioso mas tem de se preparar uma fase em que os alunos não terão acesso directo e onde, eventualmente, apenas o PC do professor terá acesso. Em Setembro, haverão novidades do lado do software mas para já duas dicas: wifi ad-hoc e mesh networking

  2. Formação de professores: ao contrário de Tapscott não me parece que esteja a haver formação abrangente a todos os professores. Mas também acho que não é esse o caminho. Os professores não são “ilhas”. Estão integrados numa escola, num agrupamento e estão (ou deveriam) ter acesso à Internet. É preciso que as redes / comunidades funcionem na disseminação das práticas.

  3. O Magalhães do professor: na fase da disseminação da tecnologia, apenas uma falha grave tenho a apontar. O não fornecimento de um Magalhães aos professores do 1º ciclo. Todos os professores do 1º ciclo necessitam ter um Magalhães seu mesmo que a um preço de 50 ou 100 euros. É essencial para eles ficarem imersos no ambiente dos alunos. Eventualmente, esta falha já está em vias de ser corrigida...


O “meu papel” nisto?

A fase da disseminação das práticas de utilização pode ser ganha ou perdida.

Quem utiliza Linux há alguns anos conhece a potencialidade que um sistema aberto e livre pode ter na educação desde que quebrado o efeito de rede que a presença do Windows em 95% dos desktops tem criado. Com engenho e empenho pode fazer-se história na quebra desse efeito de rede. Ou seja, na criação de um ecossistema nacional composto de uma indústria nacional forte e associativismo com impacto na sociedade.

A Caixa Mágica tem desafiado associações e hoje tem projectos com cinco diferentes entidades, cada uma trazendo valor ao projecto Magalhães. Em Setembro serão divulgados.

Mas há espaço, e necessidade, para que outras entidades participem fazendo bem aquilo que é a sua missão.

Cada um tem um papel:

  • Professores: não há como dizê-lo de outra forma. Para o bem e para o mal, serão eles que criarão as dinâmicas dentro da sala, que influenciarão o tipo de utilização em casa e são eles os principais actores dos próximos 12 meses. Podem se desculpar em falta de condições, de formação ou de motivação. Mas dificilmente terão outra oportunidade de ter tão grande impacto no que se propuseram fazer das suas vidas: ser o motor da sociedade através da educação dos que estão agora a começar o seu percurso.

  • Conteúdos, Internet, Internet e Internet: é tudo sobre a Internet. Depois de ligado à Internet, as crianças não utilizam mais as aplicações locais. Eles são jogos on-line, messenger e conteúdos. É preciso ser empreendedor e original, não repetindo receitas lá de fora mas serviços novos que vão de encontro ao que eles e pais e professores precisam. É preciso criar redes. Promotores da iniciativa, fornecedores de software (Caixa Mágica e Microsoft) e fornecedores de conteúdos precisam de se promover reciprocamente. Polinização cruzada.

  • Pais: alguns pais não têm comprado Magalhães para os filhos. Não por questões financeiras mas porque acham que o Magalhães é marketing governamental, porque lhes disseram que comprando o Magalhães não têm direito ao e-escolas ou porque “o irmão já tem”. Deixem-se disso. Assistam a uma conversa do vosso filho sem Magalhães com os colegas que têm e percebam o problema. Mesmo bem intencionados, “isto” é sobre eles e não sobre nós.
    Mais, no suporte ao Magalhães detectamos que o número de ligações à Internet é extraordinariamente baixa. Os pais não estão a ligar em casa os Magalhães aos acessos existentes por razões de segurança ou desconhecimento. É preciso, com acompanhamento eficaz, ir ligando-os à Internet e ajudá-los a perceber perigos e oportunidades.

  • Aos pais que já utilizam Linux: a melhor rede de suporte somos nós que vamos pô-los à escola, à natação e aos escuteiros e que somos bombardeados com dúvidas de informática. Desta vez, as questões não são como se tira o virús do Windows mas como se mete o SuperTux ou a rede em Linux. É a nossa vez.

Caro presidente Obama, daqui a 12 meses ainda pode estar melhor.

publicado por Tintim às 10:37editado por Fábio Teixeira em 12/10/2010 às 10:57